domingo, 2 de setembro de 2018

Angel



Não restando mais nada, nem qualquer outra chance segura de permanecer por ali, Angel resolve retornar para seu ponto de origem. Seguindo pelo túnel escuro ele vê aquela luz distante e caminha por longos minutos até atingir a luz. Ali, ao fim do túnel, ele se lembra do gigante que tentou impedir sua passagem e se esconde assim que vê. O gigante ainda não notou sua presença. Seu coração acelerado bate tão forte que talvez alguém consiga ouvir. Sua respiração é ofegante e ele não consegue conter o nervosismo quando de súbito uma mão gigante o alcança e o agarra tão rapidamente que ele não esboçar qualquer reação. O horror toma conta de si quando ele percebe que sua vida chegou finalmente ao fim. Um filme passa em sua frente enquanto ele permanece de olhos fechados, sem ter coragem de abri-los para encarar seu algoz.

– Não faça nenhum barulho – diz uma voz suave num susurro. Angel finalmente abre os olhos e pode ver que quem o apanhou não foi o temido gigante, mas uma figura feminina da mesma espécie. Ela o esconde em sua mão e caminha para longe do gigante, que não estranha a movimentação dela.

Eles caminham por um corredor bastante amplo de aparência bastante antiga, calçado de paralelepípedos. Paredes de pedra se estendem por ambos os lados e o céu está coberto de nuvens escuras. A figura gigantesca abaixa sua mão e o solta logo após uma curva, quando o gigante não está mais visível. Ela o olha com ternura, mas não diz mais nada. Ele agradece pela bondade inclinando a cabeça e segue seu caminho.

Ele passa por um local coberto de barro seco e se lembra que aquele é o exato caminho por onde veio, mas chovia naquela ocasião e anteriormente ali se encontrava uma poça de lama. Angel agradece em silêncio o fato de não estar chovendo e ele não sabe quanto tempo se passou desde a última vez que esteve ali.

Após caminhar por mais um tempo, ele alcança o fim do amplo corredor, que termina numa parede de pedra com uma velha porta de madeira ao centro. Ele abre a porta com cuidado evitando fazer barulho e adentra em um local mal iluminado, cheio de entulho e com cheiro de mofo. O chão está completamente molhado, formando uma lama escorregadia. O local é bem amplo, o teto é absurdamente alto, as paredes mostram um desgaste completo, com vários tijolos à mostra e ele pode ver que existe um segundo piso no alto à direita. Lá em cima há um varal com uma camisa encardida estendida. Ele não sabe como alguém chegou lá em cima, pois a única escada que levaria até está destruída e somente cinco degraus estão inteiros, o resto desabou e se juntou aos outros entulhos no chão.

Angel não se lembra daquele local e sente o medo tomar conta de si, mas segue caminhando próximo à parede na ponta dos pés, evitando fazer barulho. Ele escala uma montanha de entulho para alcançar o portão de madeira que vê adiante. Goteiras caem do teto e deixam o caminho enlameado. Ele se desequilibra e precisa levar as mãos ao chão para não cair. Após escalar todas aquelas pedras ele finalmente alcança o portão, que está fechado com uma grossa corrente, mas a madeira completamente podre cede com facilidade a qualquer força e assim Angel consegue empurrar a parte mais baixa e forçar sua passagem para o outro lado.

Uma luz branca muito intensa o cega quando ele atravessa o portão, fazendo-o levar as mãos aos olhos para se proteger. Ele se detêm com os olhos fechados e sente uma leve brisa quente tocar seu rosto e fazer balançar seus longos cabelos. Quando a sua visão finalmente volta ao normal ele fica totalmente chocado com o que vê. Sua cidade não existe mais. Ao invés das ruas, prédios e árvores que costumavam estar ali ele se vê diante de um vasto deserto de concreto entulhado até onde a vista alcança. Não há um ponto verde sequer, nem uma criatura viva sobre a terra ou nos céus.

Angel está sozinho.

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